Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, GRAIN, Inter Pares, Solidarity Sweden-Latin America, FIAN e National Family Farm Coalition | 20 de julho de 2016 Procuradoria Regional do Sul do Piauí abre processo por grilagem de terras contra negociante que vendeu terras à imobiliária agrícola Radar S/A, cujos sócios são a Cosan S/A e o fundo de pensão internacional TIAA-CREF Um comerciante de terras brasileiro envolvido na venda de terras agrícolas para fundos de pensão dos Estados Unidos, Canadá, Alemanha e Suécia poderá sofrer processo criminal por ter grilado terras. O Procurador da Vara Agrária do sul do estado do Piauí entrou com ordem de cancelamento de 124.400 hectares de terras ilegalmente adquiridas por Euclides De Carli na área da cidade de Santa Filomena, no sul do Piauí. A decisão foi oficializada em 5 de julho de 2016 pelo procurador Francisco Santiago pelo motivo de prática de grilagem de terras. O procurador pretende entrar com processo criminal. O fundo TIAA-CREF Global Agriculture LLC, que administra investimentos de fundos de pensão nos Estados Unidos, Canadá, Alemanha e Suécia, é um dos principais investidores estrangeiros em terras agrícolas no Brasil. Até 2016 o fundo havia adquirido mais de 250 mil hectares de terras no Brasil, grande parte na região do MATOPIBA (entre o Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), conhecida como “última fronteira” que tem sido tomada pelo monocultivo de soja no Brasil. TIAA-CREF e seu sócio local, a Cosan S/A, admitem que adquiriram terras no MATOPIBA através de De Carli, porém alegam seguirem procedimentos prévios “exaustivos” de diligência acerca da proveniência das terras.[1] Um relatório lançado em 2015 revelou as ligações entre De Carli e o fundo TIAA-CREF.[2] Segundo o documento, TIAA-CREF violava suas próprias regras de conduta ao adquirir fazendas de um comerciante acusado de grilagem de terras, em uma área onde ocorrem conflitos fundiários. O relatório apresenta evidências de que TIAA-CREF teria adquirido terras em Santa Filomena, no Piauí, justamente na área onde a Vara Agrária constatou que De Carli grilou terras. Em resposta ao relatório, TIAA-CREF declarou ao jornal Financial Times que as acusações “eram imprecisas e não tinham mérito”. De Carli também negou ilegalidades e contestou as acusações alegando que fariam parte de uma campanha de difamação proveniente de um político local.[3] “Não é mais possível para a TIAA-CREF e os fundos de pensão que nela investem negarem suas conexões com grileiros de terras no Brasil”, afirma Fábio Pitta da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos. “A decisão da Vara agrária do estado do Piauí mostra que tais fundos estão negociando com conhecidos grileiros de terras para adquirir áreas pertencentes às comunidades locais”. Outros fundos de pensão que investem em terras agrícolas através de TIAA-CREF incluem AP2 da Suécia, British Columbia Investment Management Corporation e Caisse de dépôt et placement du Québec no Canadá, e ÄVWL na Alemanha. “A alegação de fazer diligência prévia por parte da TIAA-CREF é uma farsa”, diz Devlin Kuyek da GRAIN. “Os fundos de pensão não estão apenas promovendo um modelo de agricultura industrial e destrutivo em uma região rica em biodiversidade como é o Cerrado brasileiro, mas também estão contribuindo diretamente para a expropriação de comunidades locais e de populações indígenas que preservaram tais terras e vivem delas há gerações”. Comunidades locais na região do MATOPIBA têm se manifestado como fortemente contrárias à recente expansão em larga escala do monocultivo de soja. Em 23 de junho de 2016, comunidades tradicionais dos quatro estados tomaram as ruas de Palmas, capital do Tocantins, em um protesto contra esse projeto. Em comunicado, declararam: “Não ao Plano do MATOPIBA, que é um projeto de destruição e morte do Cerrado e de seu povo no Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia”.[4] Organizações sociais e pensionistas que investem em TIAA-CREF demandam que a empresa torne pública a exata localização e as características das fazendas que seus fundos estão adquirindo no Brasil e em outros países. Conhecendo os impactos negativos e os riscos associados a tais investimentos em terras, afirmam que somente a divulgação dessas informações poderá comprovar se os argumentos de TIAA-CREF podem ser confiáveis. Contatos para a imprensa: Fabio Pitta, Rede Social de Justiça e Direitos Humanos (Brasil), [email protected], +55-11-996136920 Maria Luisa Mendonça, Rede Social de Justiça e Direitos Humanos (Brasil), [email protected], +1-510-2838374 Devlin Kuyek, GRAIN (Canada), [email protected], +1-514-571-7702 — [1] Simon Romero, "Fundo de pensão americano comprou terras irregularmente no Brasil, diz jornal”, Folha de S. Paulo, 17 de Novembro de 2015, http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2015/11/1707431-gigante-americana-comprou-terras-irregularmente-no-brasil-diz-jornal.shtml [2] Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, GRAIN, Inter Pares, e Solidarity Sweden: "A Empresa Radar S/A e a Especulação com Terras no Brasil” Novembro de 2015, http://www.social.org.br/files/pdf/RevistaREDE2015paranet%202.pdf [3] Gregory Meyer, "The Great Land Rush: Investors face conflict in quest for farms”, Financial Times, 2 de março de 2016, http://www.ft.com/intl/cms/s/0/84a646a0-dedc-11e5-b67f-a61732c1d025.html#axzz41qs4sBsO [4] Assembleia dos Povos indígenas do Goiás e do Tocantins, "Matopiba: Killing the Cerrado and its people," 23 de junho de 2016, http://www.farmlandgrab.org/post/view/26329